Vamos começar pelos desafios. O volume de dados gerados pela indústria dos transportes é efetivamente um dos grandes desafios do setor. Mas também uma clara oportunidade. Aliás, o repto não é propriamente o volume de dados gerados mas mais concretamente como os transformar em informação útil ao negócio. Aliás, como em todas as indústrias. Como pegar em esses dados, analisá-los e converte-los em informação que possa depois ser usada na construção de um ultra eficiente sistema de transportes?
Mas comecemos com um desafio ainda mais concreto: há que mover as pessoas. Constantemente. E há que continuar a mover bens. Mercadorias. Um verdadeiro repto tendo em conta que hoje somos sete mil milhões de pessoas mas em 2050 seremos 10 mil milhões.
Aliás, o aumento populacional tem sido absolutamente imparável nas décadas mais recentes. O mundo demorou 123 anos a passar de mil milhões de habitantes em 1804 para os dois mil milhões 1927. Mas apenas 32 anos depois, já se contabilizavam três mil milhões de pessoas no planeta e desde então o intervalo não parou de se estreitar: quatro mil milhões em 1974, cinco mil milhões em 1987, seis mil milhões em 1999, sete mil milhões de habitantes em 31 de outubro de 2011, 60% dos quais na Ásia. O ano passado, chegamos aos sete mil milhões. “Pessoas que cada vez viajam mais. O número de quilómetros percorrido por habitante tem vindo a subir todos os anos. Ou seja, temos um setor dos transportes muito ocupado e um cada mais movimentado e também ocupado mundo”, explica Mike Greenan, Rail and Transport Infrastructure director na Altran.
Para além do mais, como não é difícil de perceber, essas movimentações acontecem de forma mais pronunciada nas áreas urbanas. “O setor urbano tem vindo a registar um aumento enorme de solicitações face aos meios rurais. O desfio é precisamente gerir uma infraestrutura com todas estas pessoas e as suas diferentes necessidades”.
Mas como tem reagido o setor dos transportes a tudo isto? Está esta indústria a conseguir fazer face ao novo mundo que prima pela mobilidade? Mike Greenan garante que sim. E que, no geral, a indústria está a responder a estes desafios, nomeadamente ao aumento da população e ao facto de cada vez mais preferirem as cidades para viver. “No transporte ferroviário, por exemplo, é uma tendência mundial a proliferação das redes de alta velocidade, tipicamente concebidas para transportar uma pessoa de uma grande cidade a outra grande urbe. É uma tendência.”
A juntar aos transportes de longa distância, os sistemas urbanos de transporte têm vindo a sofrer uma mudança radical. “Sou britânico, trabalho em Londres há mais de 15 anos e na linha de metro Jubilee costumava esperar, entre comboios, dez minutos. Hoje, espero dois minutos. É uma enorme melhoria. E continua com níveis de ocupação como antes, apesar de a frequência ter aumentado significativamente. Ou seja, os desafios a superar são imensos. O mesmo se passa na aviação. Ou seja, a infraestrutura está a responder”.
Mas então se está tudo a correr bem, qual é o problema? O problema, diz Mike Greenan, é que já é complicado atualmente gerir todos os dados. “Não diria caótico, mas é complicado. Imaginemos dentro em pouco quando tudo for em dobro. Sobretudo, será que conseguiremos gerir quando algo correr mal?”
Mas os desafios não ficam por aqui. Porque há que gerir igualmente os ativos ligados a este setor. Comboios, carros… automóveis. E há que gerir os fornecedores. E, por exemplo, há ainda que gerir os sistemas de bilhética, a manutenção e até os telemóveis. “Vai haver cada vez mais sistemas, mais evoluídos, inclusivamente mais verdes. E tudo isto vai gerar cada vez mais dados. Estou no setor há bastante tempo e desde os anos 60 ou 70 que os sistemas nos fornecessem dados. Mas nós não os usamos para gerir. Podemos usá-los em caso de acidente mas geralmente só tiramos partido de uma infinita parte dos dados gerados na gestão dos variados sistemas”.
No futuro, aliás, já acontece, diz Mike Greenan, os dados vão ser usados de uma forma mais inteligente. “É quase como se fosse a nova ciência.” Os desafios de gestão destes sistemas super-ocupados e que se movimentam a uma velocidade louca vão ser extremos. Porque não podemos dar-nos ao luxo de parar. De falhar. De haver uma pausa no sistema. Seria catastrófico, não em termos de segurança dos passageiros, por exemplo, mas em termos de haver tanta gente a depender do sistema que tem cada vez mais de ser fiável. E, acredito, a chave de tudo isto está nos dados.” Uma nova ciência, como diz Mike Greenan, que reúne dados vindos de vários sistemas e que ajudarão a gerir os novos modelos de transporte. E, da mesma forma, ajudarão à manutenção dos ativos. No final, no entender deste executivo, irá levar a um melhor serviço aos passageiros.
A acrescentar a tudo isto, como se já fosse pouco, temos ainda os passageiros que vão passeando pelas cidades e interagindo com os mais variados sistemas de transportes através dos seus smartphones. E, também eles, a gerarem cada vez mais dados.
A indústria das Tecnologias da Informação e Comunicação é absolutamente relevante enquanto fornecedor da própria modernização e promotor de encontro de respostas mais adequadas por parte do setor dos transportes. “Só quem tiver muito distraído é que não verifica que é exatamente isso que se tem passado nos últimos anos em toda a parte”, diz José Silva Rodrigues, assessor da administração do grupo Barraqueiro e ex-presidente da Carris e da Metro de Lisboa e Transtejo.
E Portugal, ao que tudo indica, tem acompanhado este movimento de modernização, percebendo que o motor do crescimento, da melhoria da qualidade do serviço prestado diariamente nos vários modos de transporte, é sustentado pela inovação e pela criação de novos produtos que vão ao encontro das necessidades do mercado.
Hoje, está já generalizado que o foco tem de estar no utilizador. “Já passamos há muito tempo a cultura da empresa focada em processos. Da empresa de meios para finalmente percebermos que o que nos pode fazer melhorar o nosso próprio desempenho, quer nos tipos de produtos que somos capazes de produzir e defender, quer na própria melhoria e sustentabilidade das empresas do setor é olhar para o cliente. É perceber que temos de produzir aquilo que é importante para o mercado, aquilo que o cliente valoriza, sendo que os mercados são diferentes e os clientes são diferentes e que neste mercado, como em todos os outros, a segmentação não pode deixar de estar presente”.
Silva Rodrigues fala mesmo em disrupção das necessidades do mercado. “Até que ponto aquilo que estou a apresentar vai ao encontro do que o consumidor precisa?”
Aliás, o gestor diz que o tema, mais do que o dos transportes, é o da mobilidade. Que é mais do que transporte. “No mundo em que vivemos, este tema tem uma relevância muito grande. A necessidade de mobilidade vai ser crescente e temos de ser capazes de ir ao encontro e até antecipar respostas que possam colmatar e melhorar aquilo que são as necessidades dos diferentes mercados, neste caso do transporte público”.
As cidades têm vários problemas, nomeadamente a sua dimensão, a sua escala. Isso requer, segundo Silva Rodrigues, a reorganização das próprias cidades e das suas redes e requer que as empresas sejam capazes de encontrar soluções que garantam a sustentabilidade do ponto de vista ambiental, energética e obviamente financeira.
Uma sugestão que Silva Rodrigues tem vindo a apresentar é a de uma gestão integrada do sistema. “Em Portugal não há um dono do sistema e por isso não há uma gestão. E por isso cada empresa e cada operador vai fazendo o que pode, quando pode e como pode. E tem feito várias coisas”.
O setor dos transportes está em “transformação convergente”, diz Cristina Dias, presidente dos Transportes Intermodais do Porto e vice-presidente da CP. A executiva admite que a população tende a estar concentrada nas grandes cidades, havendo uma série de desafios inerentes. Primeiro, os transportes têm claramente de ajudar ao crescimento. Um crescimento sustentável e verde. “Temos de responder com uma eficácia energética a uma preocupação ambiental nunca vista até agora. Mas chegou a hora. Chegou o momento de dar uma real oportunidade ao transporte público em detrimento do individual. É o transporte público que vai ajudar a este crescimento, competitividade e coesão”.
Tudo isto claramente suportado em sistemas inteligentes, que devem ser intermodais, integradores e inclusivos. “Os sistemas de informação são instrumentais para nos ajudar a atingir os nossos objetivos, até porque temos um cliente cada vez mais exigente, que quer tudo para agora. E, por outro lado, os recursos que temos disponíveis são cada vez mais escassos”. Por isso, Cristina Dias fala em olhar de forma muito parcimoniosa para o painel de ativos e ver como estes podem ser rentabilizados.
De resto, a responsável acredita que Portugal tem excelentes exemplos em como os sistemas de informação ajudam as empresas de transportes a prestar um melhor serviço ao cliente, nomeadamente através da bilhética sem contacto. “Cerca de 74 milhões de passageiros de Lisboa utilizadores da CP têm os seus títulos de transporte desmaterializados. Este fenómeno, para além de outras vantagens, trouxe uma economia de papel na ordem das 22 toneladas. Há pequenas/grandes coisas que têm efeitos absolutamente fantásticos para colaborar e contribuir para os objetivos estipulados”.
A empresa Comboios de Portugal tem dois modelos diferentes, quer em Lisboa quer no Porto. Em Lisboa, cada operador tem o seu modelo de bilhética, existindo depois uma entidade formada por operadores públicos e privados que faz a integração dos diferentes modelos. Ou seja, o cliente pode comprar o seu título de transporte seja na Transtejo, seja na Fertagus, seja na CP que lhe dá o direito a viajar em qualquer modo de transporte.
No Porto o sistema é, nas palavras de Cristina Dias, mais avançado. “É a minha visão para onde devemos evoluir. Aqui, temos mesmo o ticket-as-a-service”. Chama-se TIP, Transportes Intermodais do Porto, e detém a infraestrutura, o software e os próprios equipamentos. “Os operadores pagam por cada transação efetuada pelos seus clientes no uso dessa bilhética”. Os utentes podem entrar no metro e sair no comboio e voltar a entrar no autocarro dos STCP. “São dois modelos completamente distintos mas a trabalhar para aquilo que o cliente precisa: facilidade e intermodalidade na sua deslocação”. Hoje, o passageiro não escolhe a sua viagem por esta ser realizada de autocarro ou comboio. Ele quer ir de A para B, apanhar o menor número possível de modos de transporte e com o mínimo de transbordos. “E isso que ele quer. E não quer saber se é público ou privado. Quer é ir de A para B com melhor conforto, melhor preço e no menor espaço de tempo”.
O movimento espontâneo das pessoas quer do interior para o litoral quer mesmo das periferias para os grandes centros urbanos agora reabilitados cria, obrigatoriamente, alterações ao setor dos transportes que tem de ser ágil o suficiente para se ajustar às novas “paisagens”.
No entanto, António Ramalho, presidente das Estradas de Portugal, acredita que no nosso país a situação é relativamente pacífica quando comparada com a visão dada por Mike Greenan. Mas vamos a números. Segundo António Ramalho, não existe em Portugal nem na Europa uma tendência significativa de aumento dos volumes de mobilidade. E não existe porque hoje em dia o nível de concentração urbana é, em Portugal, de 63,5%. Na Europa, a média está em 70%. “Se Portugal passar para a média europeia, ou seja dos 63,%5 para os 70%, estamos a falar em 70 mil pessoas a acrescer ao movimento urbano. O que, em termos de transportes e mobilidade, é rigorosamente zero. Simplesmente não é preocupante”. Ou seja, para os números de concentração urbana, António Ramalho garante não ir haver qualquer tendência demográfica concentrada.
Mas, pelo contrário, admite alguma tendência que apelidou de “centriptista” do ponto de vista da concentração da reorganização dos centros urbanos. Durante um determinado período, a expansão demográfica e as migrações eram evidentes para aquilo que era a nova construção urbana, tendo passado a existir zonas periféricas às grandes cidades com estruturas que não têm as mesmas condições das grandes urbes. “Exemplo disso é a Amadora que não tem a mesma qualidade de serviço da cidade de Lisboa. Quando, no entanto, tem 7378 pessoas por quilómetro quadrado enquanto Lisboa tem 5207”.
António Ramalho falou ainda nas novas tendências de trabalho à distância, potenciado pelas novas tecnologias e qualidade de comunicações, o que aporta uma redução significativa da necessidade de mobilidade física.
Tudo isto cria, no entender deste responsável, duas tendências. Primeiro uma clara e substancial mudança na mobilidade urbana, através do incremento significativo das penetrações do transporte público por virtude das necessidades de concentração. O que pode levar, inclusivamente, à inversão do princípio dos quilómetros percorridos. Porque se é verdade que os passageiros têm vindo a aumentar o número de quilómetros executados, é provável que esse número venha a descer nos próximos tempos. “E com um aumento claro dos denominados soft modes, como é o caso da bicicleta”.
Por outro lado, diz António Ramalho, vai haver necessidade de concentrar novos conceitos do ponto de vista de mobilidade global porque há cidades que vieram ganhar um verdadeiro conceito global. “Lisboa, quer por transporte marítimo, aéreo… ganhou capacidades de mobilidade internacional que não são comuns às outras cidades portuguesas”.
Tudo isto veio alterar o paradigma do modelo da mobilidade, diz o gestor. Até hoje era uma mobilidade de pessoas mas, cada vez mais, a mobilidade de mercadorias ganha terreno, esforço, importância e relevância face à mobilidade das pessoas.
Internet das Coisas, Big Data e a proliferação do uso das aplicações móveis são outras três tendências que António Ramalho assume irem alterar o panorama dos transportes.
Uma das claras materializações dos exemplos vistos anteriormente é o acordo que a Altran fez com o Governo de Portugal para um novo investimento, de 12 milhões de euros, que vai permitir criar 200 novos postos de trabalho. Os novos empregos, diretos e qualificados, vão ser criados maioritariamente na região do Fundão, no âmbito do alargamento das atividades de nearshore, no desenvolvimento de soluções no domínio de Critical Systems e Real Time Applications, soluções Machine driven Big data & Connectivity. O investimento contempla, ainda, o desenvolvimento de projetos relacionados com I&D e soluções de Complex Connectivity relacionadas com Internet Internet das Coisas.
“A Altran, como empresa global que é, tem confiança em Portugal e apoia a estrutura portuguesa suportada na excelência dos profissionais portugueses. Por isso, continuamos a investir no país e a criar mais emprego e, dessa forma, a contribuir para o crescimento da economia portuguesa”, sublinhou em comunicado de imprensa Cyril Roger, vice-presidente executivo sénior para a Europa do Sul do grupo Altran.
O novo investimento foi anunciado em junho na inauguração oficial da nova sede, em Lisboa – no Parque das Nações, numa cerimónia que contou com a participação do Vice-Primeiro-Ministro, Paulo Portas.
Em fevereiro de 2013, a Altran celebrou com o Governo português um contrato de investimento que se traduziu na criação dos mais de 120 postos de trabalho que, atualmente, a partir do Fundão, prestam serviços na área das Tecnologias de Informação e Engenharia de Telecomunicações para grandes clientes sediados na Europa. A 16 de Junho de 2014, a Altran alargou as infraestruturas do centro de nearshore, com o apoio da Câmara do Fundão, passando a dispor, desde então, de uma capacidade de 3.000 m2.
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