Alfaces ganham protagonismo no mundo das TIC?
Não. Não é normal que um CEO, no meio de uma conferência, abra uma embalagem com uma alface e a comece a trincar. Muito menos se essa conferência for de tecnologia. Muitos menos se essa conferência for no Japão, onde a formalidade dos encontros atingem níveis absolutamente dignos de registo. Mas assim foi. A dada altura, Masami Yamamoto, o CEO da Fujitsu, pega numa bela de uma alface e começa a comê-la, revelando que a mesma estava deliciosa. “Isto não é mais do que a prova de que estamos seriamente focados em soluções para a agricultura.
E não só no Japão, mas em todo o mundo, disse mais tarde este executivo aos jornalistas. A crise na alimentação é uma realidade e também é verdade que a agricultura está muito atrasada na adoção de Tecnologias da Informação e Comunicação. “É uma indústria onde as pessoas ainda se baseiam muito nos seus conhecimentos e na sua sensibilidade e intuição. Mas vemos cada vez mais países, como por exemplo a Holanda, a aplicar de forma estupenda as TIC à agricultura. Os países desenvolvidos estão a seguir esta tendência”.
E o que fez a Fujitsu? Resolveu testar, ela própria, o potencial das Tecnologias de Informação e Comunicação na agricultura. E, vai daí, produziu uma alface de luxo, cultivada num espaço totalmente high-tech. Chamemos-lhes alfaces “nerd”. Basicamente, a empresa nipónica espera que estas alfaces, que cresceram com a ajuda de sensores e computação em nuvem, provem que ainda há muito espaço para inovar na indústria da agricultura.
“Resolvemos desafiar-nos a nós próprios e vermos até que ponto as TIC podem realmente ser úteis e rentáveis. Basicamente, a mensagem que quisemos passar foi que se a Fujitsu, uma empresa de TIC, consegue produzir alface com esta qualidade, imaginem uma empresa especializada em agricultura o que poderia fazer e o quanto poderia rentabilizar as Tecnologias de Informação e Comunicação nessa indústria”.
Mas voltemos às alfaces. A Fujitsu está a receber encomendas para a sua alface produzida em instalações absolutamente estéreis. Aliás, instalações que antes eram usadas para o fabrico de chips que integravam telemóveis e outros produtos eletrónicos de consumo. Este ingrediente ou seja, a alface, é o primeiro na linha de “Kirei Yasai” (vegetais limpos) da empresa.
Mais uma achega: a fábrica é em Fukushima. Sim, exatamente no local onde ocorreu o acidente mais grave desde a catástrofe de Chernobyl. Basicamente, o que aconteceu foi que o terremoto e o tsunami que devastaram o país e que comprometeram o sistema de refrigeração dos reatores, levou a incêndios e explosões. Um mês depois, o governo elevava a emergência ao nível 7, grau máximo da escala, antes atingido apenas pelo desastre de Chernobyl. Comia alfaces produzidas neste local? Porque não?
As instalações onde são produzidos estes vegetais são em Aizu Wakamatsu, Fukushima, no norte do Japão e têm cerca de dois mil metros quadrados dedicados à produção vegetal. Aliás, a Fujitsu garante que este é mesmo o maior centro deste género focado na produção de vegetais de baixo teor de potássio. Sim, porque estas alfaces têm no máximo 100 microgramas de potássio por 100 gramas, de acordo com a Fujitsu, muito abaixo do valor normal de 490 microgramas.
Isto toma particular relevância quando estamos a falar de pessoas com doenças renais crónicas, que muitas vezes têm que reduzir a ingestão de potássio devido à função renal debilitada, e por isso têm opções entre vegetais crus muito limitadas. A Fujitsu acredita que a sua alface baixa em potássio é saborosa o suficiente e por isso conta com os centros médicos como potenciais primeiros clientes.
O preço de cada embalagem de 90 gramas deverá rondar os 4,90 dólares, mais ou menos o dobro do preço destes produtos encontrados nos supermercados japoneses mas… mas foi criada com a ajuda de semicondutores e computação em nuvem.
A experiência da Fujitsu nos semiconductor em ambientes “limpos” foi usada para descobrir as melhores condições de crescimento e como controlar microrganismos. Aliás, a alface não necessita ser lavada antes de consumida. Basta abrir o pacote e…
Por outro lado, foi utilizada uma plataforma de cloud de agricultura e alimentação que permitiu decidir sobre as melhores condições atmosféricas, como por exemplo a temperatura e humidade, bem como os níveis de adubação para alcançar uma cultura ideal.
Sensores ao longo das fileiras de alface foram reunindo os dados sobre como está o produto a crescer. Já os algoritmos analisaram os números e, ainda, as recomendações sobre procedimentos, tais como tempo de colheita, foram sendo enviadas para os trabalhadores.
Este serviço de nuvem, denominado Akisai, está relacionado com outro projeto de agricultura de TI no Japão, chamado Nosho Navi, coordenado por Teruaki Nanseki, professor de agricultura da Universidade de Kyushu, no sul do Japão.
Os agricultores da província de Shiga perto de Kyoto, têm vindo a utilizar smartphones para fazer upload de dados sobre as plantações de arroz e outros trabalhos de colheita para um servidor na nuvem que, por sua vez, sugere a quantidade de água a aplicar e quando colher o arroz.
A ferramenta é vista como útil para jovens agricultores inexperientes ainda para mais no seio de uma população que está deveras envelhecida.
Só para verem até que ponto a Fujitsu está comprometida, a empresa de TI vê um futuro verde para os vegetais baseados na nuvem e estima que em 2017 as vendas atinjam os 400 milhões de yenes por ano. Ou seja, 2,87 milhões de euros.